PENDE DO TETO UMA LÂMPADA
pende do teto uma lâmpada
coloca em meu mundo o amarelo opaco
de quarenta e cinco watts
um portão de ferro separa dois mundos
pedras eternamente cinzentas
passivas pedras
por que não deixam as portas escancaradas
e a madrugada invadir os corredores
mais tarde virão os bêbedos
machucando na boca devassa
uma canção de Vicente Celestino
_a lua prateada não despertará as suas amadas_
minha rua é um cemitério
o gordo estrábico
a fofoqueira
o dono da bodega
a mulher e a filha
a menina magricela morreu ontem
a vitalina moralista abre a porta
quem diria
entra o motorista
o guarda-noturno puxa o gancho das portas onduladas
faz o giro vagarosamente
pesadamente
parece um assassino disfarçado
pobre homem
o clarão da luminária de mercúrio
cria uma atmosfera de neblina
besouros quebram as asas nas paredes
há borboletas no limo dos telhados
no coletivo vazio
escorrega o cobrador num cochilo
moedas quebram a quietude
uma jovem de rosto cansado desce para o cais
Década de 60