AO QUE VAI TARDE
Durando a vida por excesso e dano,
No mais que por apreço -- ou vício -- ao cego
Apraz sobrando além do justo, o apego
Ao que de si diz sim, julgando humano
O poster, o cartaz, a propaganda
-- vaidade, medo e vivas por demanda.
Habita o verbo errar por armadura
Sinistra, a guarda vã dum tempo findo.
Imerso nessa luz que vai partindo
Aos poucos, fria, de algum modo impura,
Sem sombra que lhe acuse o ser, é lenda,
O estorvo num crepúsculo que o ofenda.
Outono a meio a angústia costumeira
Da fala sem dizer, mudez injusta
Em dolo, na indelével falha augusta
Em jingle que não fede, que não cheira
Embora tente (por carente) a treta
Que se interpreta, hermética, concreta.
Silêncio obtuso o olhar é surdo apelo
A quanto seja forma em si vazia.
O agora vão modorra em paz e azia
Se encanta em Kant a tal noção do Belo.
São dias de dizer "Adeus, amigos!"
E o instante é o mais inútil dos abrigos.
Além do pó, que a chama encontra acesa,
Um nome em tipo cult, e lá no após,
Resiste, um busto contra a doce algoz.
Viver talvez fosse isso, essa defesa
Heróica duma casca em tudo indigna,
Que cede, enfim, pilhéria algo maligna.
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