PÉRIPLO
A vida bêbada naufraga em si,
De líquidos sorrisos sempre farta
Em poças, cinza, datas, firmamentos,
Pelo ir e vir das ondas exilada
-- de boa, até sem brisa pela proa,
Sem qualquer Ítaca no incerto fim.
Que mundo imenso de perder-se em vão!
E os deuses todos monstros, já, no abismo
Do qual jamais imaginou nem pistas
Nos rumos de vagar sem ter destino.
.
"Observa atentamente, agora, espia :
Nenhuma dessas ilhas é Utopia." --
À taça desse pranto coletivo
Convém essa ária de sereia à toa
E as lágrimas dum deus vencido há pouco
E rochas mastigando um triste casco.
.
Pelos mares de dias esquecidos
No azul de exagerar profundidades
Deixamos nossos mortos mais urgentes
Ao tumulto das ondas impassíveis --
Submisso à tirania dos faróis
O horizonte brandia seus enganos.
.
Sonhando em Patmos das visões cabais,
A noite enfim prescindirá de cais.
Abriga as madrugadas da agonia,
De pressentidos anjos e sentenças
Enquanto tudo o mais digere ausência
E silêncios, arcaicas escrituras
Durando a luz intermitente e fria
De estar ali, sem cúmplice e feliz.
...