PÉRIPLO

A vida bêbada naufraga em si,

De líquidos sorrisos sempre farta

Em poças, cinza, datas, firmamentos,

Pelo ir e vir das ondas exilada

-- de boa, até sem brisa pela proa,

Sem qualquer Ítaca no incerto fim.

Que mundo imenso de perder-se em vão!

E os deuses todos monstros, já, no abismo

Do qual jamais imaginou nem pistas

Nos rumos de vagar sem ter destino.

.

"Observa atentamente, agora, espia :

Nenhuma dessas ilhas é Utopia." --

À taça desse pranto coletivo

Convém essa ária de sereia à toa

E as lágrimas dum deus vencido há pouco

E rochas mastigando um triste casco.

.

Pelos mares de dias esquecidos

No azul de exagerar profundidades

Deixamos nossos mortos mais urgentes

Ao tumulto das ondas impassíveis --

Submisso à tirania dos faróis

O horizonte brandia seus enganos.

.

Sonhando em Patmos das visões cabais,

A noite enfim prescindirá de cais.

Abriga as madrugadas da agonia,

De pressentidos anjos e sentenças

Enquanto tudo o mais digere ausência

E silêncios, arcaicas escrituras

Durando a luz intermitente e fria

De estar ali, sem cúmplice e feliz.

...

Israel Rozário
Enviado por Israel Rozário em 07/03/2020
Código do texto: T6882414
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