PEDAÇOS DE UM CONTO VI

Lorena preservava o sonho que Ofélia almejava em Shakespeare; não queria o convento e a obrigação de se vestir e portar como tal. Lorena, Lorena e Lorena... Chamava o próprio nome, Como os que invocam espíritos invocam espíritos; invoco a mim mesmo e não encontro nada: parafraseava Pessoa em Tabacaria. Mas Lorena não fumava.

Colocava-se sempre ao que quer, ao almejar, ao idealizar e conseguir a metade do que tinha e o inteiro do que devia: Lorena era como a dona Cora Coralina, incompreendida, sempre a frente do tempo, talvez escreveras e publicaria aos 70 e pouco.

Quando estudava a gramática ao seu português era Lorena; e Lorena mantinha o português, nada saia da cabeça ao papel, só ali naquele pedacinho tinha vida e vida com abundância. Era uma confusão como um "textinho" desse. Nunca saiu de onde nascera... e jamais teria outra vida... Algumas certezas aprendemos como Lorena!

Fazia seu papel corretamente; escrevia belas poesias e ninguém lera... ouvia o que ninguém escutava... comia por vontade o que outros não apreciava por nada no mundo! Lorena conseguiu um lugar a mais no mundo, um lugar a mais dentro de si mesmo, a confusão vinha dela, mas não era ela. Aliás, ela não é, vai sendo...

Leu em algum lugar que amar é sofrer (pobre do que lê e acredita). Lorena nunca amou, nunca viveu. Era como tantas outras que existe.