COISAS FRÁGEIS
Quebradiças mas altivas
Linda e conservadas
Sozinhas e orgulhosas
Únicas e tão invejadas
Coisas como eu e você
Vividas e gastas
Sem sepulcro, sem direção
Objetos de delicado manuseio e difícil obtenção
Valiosos pela fugacidade, onerosos pelo ardor fugidio, quase mágico...
Criaturas esguias que fogem a classificação do senso comum
A categorização as trinca, métricas as enfraquecem
Tais coisas citadas e nunca entendidas...
Seres da luz plena e da treva imaculada
Fandangos, mariachis, elementais
Ninfas, pedintes, ébrios...
Atores de uma peça cancelada antes da estréia
Curandeiros impotentes perante sua própria enfermidade
Ferreiros que forjam as armas que jamais usariam...
Objetos cortantes caros como uma promessa milenar
Coisas frágeis como aqueles que escrevem pra si
Coisas intocadas como o arco-íris
Vencidas pela vida contudo quase imortais...
Em seu desejo incontido, em sua beleza efêmera e ofuscante
Rios são veias pra elas
Rosas são suas companhias
Ruínas são pegadas
E risos são seus presentes espontâneos
Manufaturados nas estrelas cadentes que já morreram antes de nascermos...
Translúcidas e holográficas
Assim como nós no panteão das moralidades e regras cegas
Inquebráveis pelo tempo e resistentes como castelos de cartas
Ou edifícios de areia
Como o recém-nascido na fila dos canibais
Protegido por algo que transcende a lógica
Coisas perenamente moribundas
Frágeis como a vida e definitivas como o fim desta
Coisas bem-vindas no Eden e desejadas no seu oposto
Batizadas com esmero além da pompa ou na simplicidade do vento
Fortes como a água e donas de si
Ainda que tão trôpegas quanto um infante aleijado
Sim, somos tais coisas, somos esses seres combalidos
Somos tênues e cansados
Mas formamos o cosmos, e nele tudo tem nossas intenções
Dispensamos qualquer aceitação ou simpatia, nos encerramos em si
Como tudo que é perfeito e eterno.