Da fragilidade das coisas

Todos os astros que brilham no céu

Dão mostras do que há de divino e

Não-natural na esfera da vida; ao

Mesmo tempo me fazem pensar

Nas coisas com as quais tenho sonhado,

Naquilo em que penso todas

As manhãs, quando cruzo a barreira

Do sono e venho para a realidade,

Que me espera, turbulenta,

Cheia de desvios para lado nenhum.

Sou parte desse caos:

Frágil criatura de Deus.

Antes de me mover, já sinto que

Estou fugindo, não para a esquerda

Ou para a direita, mas para o alto,

O lado mais frio da minha alma,

Quando o mundo dissolve as pala-

vras. E todas as palavras, que antes

Conheci, são engolidas pela dádiva

Do silêncio que me tomou, que

Se apossou do quarto e dos utensílios,

Dos lençóis sujos de suor, da falta

De amor, e do amor em demasia.

Em dado momento, dissipando o

Vazio, a luz do sol alimenta os

Tecidos do sonho, e estou de

Volta ao chão desconhecido. As

Chamas do amanhã são de rara

Cor, como uma águia que voa

Sem fim, pela atmosfera, e o azul,

E as corredeiras. Sobre e sob, em

Tempos distintos, mas com a

Mesma imaginação, o mesmo

Sabor e a vontade de construir, de

Acalmar, de aniquilar, de proteger.

Vinho tinto, branco, de nenhuma

Cor, de todas as cores, bebi e

Me santifiquei sem ao menos ter fé.

Foi o passado e não o futuro, foi

A riqueza e não a pobreza, foi a

Fome e ao mesmo tempo o que

Não podia existir, mesmo debaixo

Das árvores sonoras, quando o

Vento compôs a melodia das almas.

Foi o agora e não o desperdício, foi

A saudade e não a presença, foi

De manhã e não quando o sol

Se refugiou nos píncaros à oeste,

Que tudo se fez e se desfez, que

As últimas estrelas se refugiaram

Na mais indistinta eternidade.

João Barros
Enviado por João Barros em 10/12/2019
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