Absinto
Todo santo dia sinto o sabor dos teus lábios no cigarro que fumo
Aos maços, como se a fumaça que inalo fosse o perfume dos teus abraços
Como se tua boca, linda, língua fosse o gargalo da garrafa que trago
Sinto teus afagos quentes e ouço tuas gargalhadas gostosas no aguardente em que consumo e me embriago
Ouvindo o som que a gente curtia, que é a poesia de Drummond...
"Está sem mulher, está sem carinho..."
O infeliz do Paulo Diniz parece escarnecer da minha cicatriz…
Sinto-a, todo dia santo.
Mas ainda bem que posso beber e fumar...
Horas a fio
Por enquanto.
Re-sinto o dissabor de saber que agora saboreias outros amassos
Deve bem está se encaixando em outros pedaços
Em outros espaços vazios...
A marca do cigarro?, das mais baratas do mercado
Mas a que causa mais estrago
Que tiro de escopeta no peito?...
E dói mais que dor de parto
Mais que dor de suicida
Foi a dor da tua partida,
Que me deixou partido em mil pedaços
Qual um espelho quebrado!
Qual um jarro jogado da janela do quarto
...andar...
Anda, escolhe logo qual analogia!
Pois tem um rato em cima da pia...
Vai entrar na panela!
Preciso matá-lo.
Ele foge em meio aos pratos sujos
Deixa ir…
Então resolvo esvair minha tristeza debaixo do chuveiro
Toda vez que vejo a nossa cama vazia
Me lembro da visão do Inferno da qual falou Boccacio
Pois toda vez que vejo o teu recado:
"Sempre hei de te amar, meu amado!"
Escrito na porta do banheiro,
Com o batom do nosso primeiro beijo,
Entro em desespero e começo a chorar
Lembrando da sua boca maravilhosa
Sinto uma amargura do tamanho do mar
E o gosto amargo de te amar e, por ti, não ser amado...
De te desejar, mas por ti ser desprezado...
É incendiado em cada dose de álcool tomado...
E toda vez que vejo teu sorriso na cara do meu gato
Dá vontade de morrer provando veneno...
...de rato.
Mas lembro que não tenho sete vidas;
Queria um litro de absinto, talvez tequila...
Pra mode eu ver se sinto ainda algum brilho de vida...