Amnésia opcional

De repente eu me pergunto,

ou eu me afirmo:

-Eu posso esquecer...

sim, eu posso apagar tudo,

como apagam os poetas,

quando querem trocar a rima;

como trocam as bulas os hipocondríacos,

quando trocam as dores;

alvejar minha mente,

não tirando dela todos os pecados,

pois quero continuar sendo pecador,

mas retirar tudo que mancha meu pudor;

eu quero esquecer tudo...

que não devia ter se estabelecido,

tudo que não deve se aflorar;

fazer da memória primavera onírica,

apenas de amores-perfeitos,

de avencas que vigiam infiéis,

com margaridas, só com bem-me-quer;

posso esquecer os aromas adocicados,

que sugerem saudades patéticas,

os pés-de-nada, que juntam parasitas;

as ervas-daninhas continuarão intocáveis;

quero danar, por vezes, a paz do tédio,

quero daninhas que me mantenham atento,

para não permitir a praga grassar;

quero buscar marfins e presas

não num safári de matar,

quero conviver com a fauna e a flora,

num convívio que me faça esquecer,

de tudo aquilo, que não quero mais me lembrar

Roberto Chaim
Enviado por Roberto Chaim em 22/11/2019
Código do texto: T6801227
Classificação de conteúdo: seguro