CERTO AMOR DE PAI PELO FILHO

Certo amor de pai pelo filho nasceu farto,

com sangue forte,

com sonhos tantos,

com alma de aço,

com raiz de orgulho,

com fôlego de sobra.

Amor que não dá pra comprar,

não dá pra duplicar,

não dá pra roubar,

não dá pra plantar,

não dá pra tapear.

Um amor de lastro, de festa,

da mais liberta alegoria.

Amor sem útero, sem leite no peito,

sem fiança, sem rédea, sem feitor.

Amor que Deus inveja,

que Deus almeja, que Deus imita,

que Deus admira, que Deus espera,

que Deus nunca terá.

Mas um dia, pena,

a fonte secou, o vento enferrujou,

a verdade berrou seu canto sem cansar.

Mas um dia, pena,

a flor virou erva-daninha,

o gostoso virou esgoto,

o lindo virou podre.

Daí aquele amor tão eterno,

tão Rei, tão melado,

tão untado de maravilhas,

esfarelou.

Daí o certo amor que servia pra sempre,

que se julgava cravejado de luz,

que se tinha mais forte do que tudo,

virou pó.

Então pai e filho se olharam assustados,

então pai e filho se flagraram inimigos,

então pai e filho se afastaram decididos,

então pai e filho se desenlaçaram convictos,

então pai e filho se desabraçaram de vez,

deixando as lágrimas do coração maiores do que todo mar.

Oscar Silbiger
Enviado por Oscar Silbiger em 22/11/2019
Reeditado em 22/11/2019
Código do texto: T6800845
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