CIO

Vem a ânsia de mergulhar deserta e nua,

No mar de devaneios e tendências,

Não obstante o pudor e a inocência,

O cão fareja sua fêmea na rua.

O cais não é seguro, não é porto,

É um refúgio momentâneo da poeta,

Que introduz a língua sedenta pela boca aberta,

Como as ondas do mar lambendo o peixe morto.

A água salgada e morna que transtorna as sereias,

Faz eriçarem-se os peitos rijos de desejo,

E a poeta, induzida como aranhas pelas próprias teias,

Tece a trama de aliar o furor, a loucura e o pejo.

Lá vem a fêmea babando a volúpia do instinto,

Num ímpeto da espécie, alucinada e tesa,

Resvalando sobre rimas e versos de labirinto,

Clamando pelo amado, a julgá-la presa.

Cheiros, entorpecentes da razão, inebriantes,

Tornam o momento de impaciente magia,

Onde faz-se necessário acasalar amantes

E gerar, dentro do útero, o grão da poesia.

Lílian Maial

Rio, 07/03/01.