GRITO NEGRO
Precinho vil, negrinho servil, nem nasceu o siso,
Pregoeiro abre sorriso, anunciando próximos lotes:
Preciosas prendas, prontinhas pra emprenhar
Predadores à espreita desejam experimentar os dotes
Valei-nos Xangô, Ogum, Iansã
Negro quer sonhar um amanhã
Não me permita morrer de febre terçã
Apanha de pequeno pra aprender a prender o choro
Trabalha sem espreguiçar, chicote a lanhar o couro
Pode arder a pele, pele negra não serve para coser
Praga de vida é essa, apenas promessa qualquer prazer
Valei-me Oxóssi, Omolu, Iemanjá,
Socorram o negrinho sarará
Afastai-me dos males, Saravá!
De preconceito em preconceito distante a paz
Cabeça sempre a prêmio, pretexto não faltará
Não adianta soprar feridas, a dor não passará
Alivia as mais doloridas, faz prece aos orixás
Valei-me a proteção de Ossaim
De joelhos lavo as escadas do Bonfim
Afastai tanto sofrimento de mim
Escurece o arco-íris na linha do horizonte
Sangra o escorrer do suor na fronte
Poça de lágrimas a alagar Palmares
Liberdade, liberdade ouve-se pelos ares
Valei-me Oxalá! Poderoso criador
Escutai nossos gritos de clamor
Espalhai pela terra o amor
À benção! Todas as vozes em alerta
Mãe Menininha
Zumbi e Carolina...
Gangazuma e Clementina
Não importa quanto aperta a mordaça
Dragão do Mar...
Melodia e Itamar
Marielle e Pixinguinha
Levem à frente a honra da raça
À benção!