CANDURA NÃO DILUÍDA

não ouço mais tua voz

desde que lavaste a casa

a poeira que nos era tão cara

deu lugar ao brilho distante

não poupaste sequer uma fresta

tudo então tornou-se estéril

a vida cheirando a pinho

os olhos ardendo de soda

não vi mais o céu

desde que puseste cortinas

e me proibiste de abri-las

para que não perdessem a goma

tudo tão limpo

não sei o que é espelho e o que é azulejo

as facas enfileiradas

os copos etéreos

nem música se ouve na sala

para que não vibre partículas

me sento mas não abro os braços

e se falo os pés eu recolho

não sei mais quem és

desde que trocaste as lâmpadas

essas novas tão frias e tão brancas

nos fazem fantasmas

nem mais uma mosca

todas sucumbiram aos vapores do teu asseio

as aranhas partiram

as joaninhas nem vieram

acho que morri

quando me proibiste de comer com as mãos

as maçãs mofaram

as peras ainda não