Gesto da Solidão

Um dia ele bateu na minha porta

E sem que eu percebesse entrou no meu coração

Assim quieto, calado, me olhando de soslaio

Fez morada do que seria invasão

Um dia me faz rir, no outro chora comigo

Uma noite me vigia, na outra me toma a mão

E sem que eu percebesse se tornou meu amigo

Assim de infância, adolescência, meio irmão

Fez incesto num gesto da solidão

Um dia ele abriu minha porta

E sem que eu percebesse entrou na minha vida

Assim tranqüilo, num sorriso que conforta

Fez certeza do que seria indecisão

Um dia me faz sorrir, no outro se cala comigo

Uma noite deita ao meu lado, na outra me beija a mão

E sem que eu percebesse se tornou mais que um amigo

Assim de sempre, da vida toda, imensidão

Fez alento num gesto da solidão

Um dia eu abri a minha porta

E sem que ele percebesse lhe entreguei meu coração

Assim bem devagar, pouco a pouco transbordando

Fiz amor do que seria ilusão

Um dia lhe trago a noite, no outro acalanto

Uma noite busco as estrelas, na outra seco meu pranto

E sem que ele percebesse se tornou mais que paixão

Assim de fogo e água, terra e mar, sedução

E fiz poesia num gesto da solidão