Flechas que desvio nos pampas úmidos

Sou apenas um terráqueo tão alheio à sua planilha que quantifica sorrisos, abraços, esboços

Sobrevivo longe da sobrevida, desprovido da gana requerida pelos falsos vencedores que infestam esses pódios

Se só refletíssemos o lado forte, quem define a virtude equacionada, ou quem aponta o herói e vilão, encaminhando-nos a esse norte almejado?

Moro nesse flat de concreto imundo durante a semana inteira, nem clamei por socorro pra morte nesse tédio de segunda-feira

As rosas murcham soterradas em meu tórax de isopor, sinto-as relutando no meio dos escombros

Parece que suas vidas se esvaneceram e ainda assim seus espinhos pontudos espetaram meus ternos assombros

Suporto a dor das feridas internas nesse cômodo, já que antes obtive sopros lacunares de mínimas gotas do alívio

Só que dessa vez o tempo não foi o remédio pros velhos vícios fúteis que me levaram ao precipício

Moro nas oscilações de humor inconstantes, vejo-me em penitência pelos fatos ocorridos desde o início dos dias estranhos

Tropeço na ponta do abismo e observo como esse destino lamentável sempre foi tão previsível, lembro dela por baixo dos panos

Estanco o corte cutâneo, falho ao tentar amenizar meus vôos rasos com antídotos químicos, artifícios, uso pernas de titânio

Pra suportar todo peso que atribuo em ditas escolhas transviadas, delimitadas pelo moralismo dessa classe inconformada

Alimentando o quadro sintomático atual, atormentam quem se encontra no mesmo barco

Culpando os antigos culpados que propiciaram os novos, qual a diferença, afinal?

Cansados desse jogo de xadrez misturado com um espetáculo teatral!

Até onde teus princípios são consistentes e verdadeiros veementemente?

Minha retórica ácida desconstrói o chão de vidro que pisas, vejo tuas certezas esparramadas em cacos pelo chão do recinto

Ressinto teu semblante desorientado no próprio labirinto, tonteando com esse porre opaco de vinho tinto

Tenso, pânico, crença arruinada sob tua estabilidade crônica, tuas vistas no espelho refletem a mísera condição tectônica

Já vives apertando replay em hábitos desgastados, ásperos como a lixa que desbasta até o último pedaço do teu taco

A existência e o amor têm valor justamente por serem finitos, mesquinhos

Sendo a finitude o que consideramos ser o motor que nos conduz nesses mitos

Pois então imagine em um súbito tudo isso se repetindo eternamente, como um ciclo que retorna sempre pro mesmo caminho

Sem nada de diferente nesse filme... agora ainda enxergarias alguma luz no fim desse túnel triste?

Sempre é oportuno o desespero e espanto para que a curiosidade e desejo de vida sucumbam a angústia do melancólico pranto...

A solidão é a porta, e se será aberta ou fechada dependerá do que fará com essas palavras ecoadas por essa frase morta e caquética!

Percebo que não pensas mais coisas autênticas, só um boi marcado com códigos de barras imerso na manada epidêmica

Que só enxerga reto o que vem à frente, essa realidade no fundo é tão descontente, parece distópica

Por mais que muitas vezes se torne irritante, desafiando até o sujeito denominado mais paciente

Insistiram mas nunca capturaram minha essência, transmutação nessa expansão contínua do agora

Não deixo frestas pra erros, evidências, brechas não cobertas e expostas ao sol lá fora

As quais são tuas falhas no controle da mente, teu nítido calcanhar de Aquiles nessas batalhas travadas!

Hoje me abstenho de pensar no que foi e no que nem veio, camuflo o IP e espalho o malware pelas redes empresariais defasadas

Não me senti íntegro, sem totalidade construída, fragmentado quando convergi com a origem de tudo à flor da pele

Absurdo, ancestrais comuns, poeira cósmica, todos modelos iguais de uma mesma série!

São números, palavras e linhas rupestres, capturando pouco do âmago terrestre

Será que de fato acabou a peste? O medieval nunca foi tão real, enquanto pra ciência tudo é só um teste

Mas sei bem quem tu és, ando guiado pelas tuas sombras, sou sempre o não visto, uma posição tranquilizante pra quem já é tão sozinho

Nunca me importei com nada aqui, já que vivi o próximo milênio e retornei sabendo o que não queria

Não revelo a identidade como tungstênio, sem se encontrar na natureza no estado básico, só quando me mesclo com elementos do espaço

Adaptação que faço como o camaleão às lentes discretas, burlo esses sistemas vulneráveis com informações secretas

Decidi trocar o exoesqueleto nesses últimos dias cansativos na ilha de Creta, apesar dos calos inesperados sofridos na queda

Frutos das repetições inevitáveis, travo no espelho com a imagem, refúgio inóspito no qual me enterro, reentrante caverna

O desejo pulsante salta minhas veias, acelerando esse sangue denso, inchando minha pele, me deixando hipertenso

Vivencio o êxtase no seu toque sincero, me arrepio e abdico de qualquer senso

Quero os lábios dela sem pretexto, contexto, somente o que eu diria à ela com todo apreço, palavras que não caberiam nesse texto!

Preciso entender como ela transmite a sensação de imediatismo efêmero e de infinidade aconchegante nos beijos longos ao mesmo tempo

Rompe os padrões, entrelaça o extenso e intenso em um só momento, equilibra o cosmos, supera os deuses, templos e monumentos

Afaga meu peito nos dias cinzas, deitamos no gramado que parece uma lona estendida de vida, o qual nos abraça sem consciência de nada

E qual o preço que pago desfazendo por um segundo esse meu ego matemático e cheio de travas e gatilhos que eu mesmo desconheço?

Enquanto o inconsciente fala por mim mais uma vez, arranco meu coração e o seguro em minhas mãos inteiro

Espero pra entregar às tuas mãos ou largá-lo nos campos gélidos daqui do Sul, onde chove o ano inteiro

O que farias nesse enigma? Jogaria tudo pro alto e voaria pra que eu não alcançasse mais teu paradeiro?

Qual a minha condição nesse enfermo enredo cheio de linhas sem intersecção em nenhum ponto do roteiro?

No fim quem se vê longe e tão perto enxerga tudo de tantos ângulos abertos

A ponto de precisar uma hora retornar ao centro pra não se perder nos cantos dos losangos

Ou se dividir ao meio, se perder na extensão do diâmetro, no fim também sou como tudo, somente mais do mesmo

Tragédia cômica, sabendo do fim pelo futuro que passa nas frestas da janela, corro cambaleando pelos trajetos que traço à esmo...

Sombra Victorino
Enviado por Sombra Victorino em 05/09/2019
Reeditado em 09/12/2019
Código do texto: T6738056
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