O Banco

A casa da sobra ficava logo ali numa meia esquina de um arroto

de moribundo que vigiava as celas e a filha de um velho burro. Na envidraçada feitança de fachada, poucas matizes - ouros, anéis,

coronéis de passado, um dono de bordel - três políticos,

um capitão de fala lecionada e um guarda.

Dos transeuntes a mãozeuntes do passeio - e naquele tempo, tesouro não se guardava nas calças - no contorno - eu me misturava! Minha mãe sempre dizia que um tal de Delegado havia me dado um ofício e dois orifícios, um deles era surdo, o outro, cuidava aos mudos e, com o ofício, naquela rua, vendia balas.

Adouto - e por desbotado de própria casa - cuidado alertei até um meio irmão, mas se não - e por obra (ou raiva) do descaso - d'um tropeço de moça fina, o embaraço - e que de tão branca, engasgou-me até às rimas:

- Quanto é o pacote de balas?

Eu, meio esquadrachado pelo Sol de um pino e o canto de marquise, estonteei ao responder as falas:

- É, custa de três quintas, o engasgo e doze quatorzeavos, moça.

A moça, como se penteasse os louros, tirou das rendas d'um

vestirroda Azul seis horas, uma quantia - e por garantia, o meu engasgo:

- Aqui está, cinco quintas!

Antes do outro espanto e por de trás das quantas e o encanto,

cresceu um senhor em face de algas brancas, qual formosura

ajoelhou-se pra espanar as ferraduras:

- Escurinho, devolva o troco de mansinho e bem devagarinho porque doce de donzela não é cor de aquarela pra azul-birrão assultar os olhos!

Advocássio e por justeza, a moça e sutileza, intervém na realeza - e contraria no balcão:

- Das quintas, meu pai, e quais herdadas - e por vontade

e adestração - do verso e do quinhão, oponho à réplica, contestação!

Porém nem sempre o mar faz brotar no rosto de um tentudo, as algas brancas, de sobretudo - educação. E o mestre da cizadura ao levar a formosura, roubou-me as quintas, as balas e o coração

Desconfiado e destronado por um penico - e mal educado - voltei ao mercado de um contado e seu regalo, lembrando da moça, do verso e o contestado.

Mas, e por destreza da certeza, me afastei daquela salga ao lembrar que a rua é crua, como é nua as algas e cizadura d'um rosto de um bufão. E foi o tempo do uniforme - da marcha ao informe - chamando toda sua, a minha pobre atenção:

- Pretinho, que foi das balas aos modos da lida do Tião?

E revoltando aos olho e o andejar do capitão, me veio já um largo, o primeiro golpe e supetão:

- Negrinho é teimoso, reza o guarda e o patrão!

E quando a reza ensaia o prumo - se não ao punho - me vem o segundo enganão.

Acordo - e dessa vez mal pago - com o rosto esbofeteado em delegacia de coitado, que era grande a encenação.

Naquele cubículo - onde as paredes se abraçavam - acima da minha prateleira, tinha um outro, dessa vez um pardo, mas ajeitado, de rosto fino e afeiçoado e não distante, insisto indagação:

- Amigo do verso antigo, que foi da tua reputação?

Talvez e por confiado - até de encosto e amparo - não se furtou à prosa, à Lima e à rima do encantado:

- Ali, naquela esquina, estava a mão e obra prima e fui dar-me atenção ao rico, o patrão. E sem ver nenhum quinhão, veio o guarda e o capitão, ensinar-me à vida, um triste refrão: "- Jorna (salário) é filha rara, mais que a filha do patrão e do erário ao funcionário, do pobre e do salário, não há de aumento, nenhum tostão!"

Atento ao raro e cismo, d'uma história que também assino e qual minha surpresa, nem as pestanas se envergonharam! E cá estava eu - sem um quinhão e o pardo sem salário, em delegacia de proletário à contear duas estórias por um farto - e penico - monetário.

E - pra findar o rodeio, a estória e o mosqueteio - de um conto atravessado, de um negro encantado, cá hoje

uma lição (pra suportar a multidão):

- Da filha de um penico, ao pardo de um Leão, gentileza só há na prisão.

Jeronimo Collares
Enviado por Jeronimo Collares em 29/08/2019
Reeditado em 31/10/2019
Código do texto: T6731870
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