CIDADÃO LIVRE
Lilian Maial


Hoje acordo só
em meio à escuridão
sem paredes sem teto sem chão
eu apenas caio no escuro
por horas eu caio.
 
Lá embaixo
milhares de corpos humanos
uns braços se esforçam
somente dois braços
para me alcançar
e todos os outros
milhares de indivíduos
uns sobre os outros
como uma montoeira de ratos
sufocam as palavras
esfolam a carne
mitigam as esperanças.

E eu continuo a cair.
Desesperadamente eu caio.
E vejo que todas as cores se apagam
as lembranças se desbotam
o cansaço se aloja
o amanhã está muito distante.

E eu já desejo o solo
onde, certamente, me tomarão o corpo
me ceifarão a dignidade
e me negarão o direito
de dizer o último poema.

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