Como uma puta
Um cachorro magro,
cagando exatamente em cima de uma lombada no meio da rua
enquanto essa chuva desaba sem dó.
Dois mendigos
conversando e dividindo uma sagrada lata de aguardente
no canto mais negro da calçada
enquanto os carros tentam enxergar dentro da noite com seus faróis.
Ela na cama e devidamente molhada
gemendo, quase sem emitir som algum
e coberta apenas pelo escuro de nosso quarto.
Isso faz parte do silêncio,
esse silêncio que está sempre ao meu redor
e que me esbofeteia
como a uma puta sem sorte numa noite quente e azarada.
O que me aflige é inteligível.
Pode apenas ser sentido, nada mais.
E sei que isso permanecerá em escuridão e mistério
até que algo desenterre essas velhas e desoladas raízes
e eu, desnudo e finalmente liberto de toda a razão que me resta
veja o meu pobre reflexo estremecer
ao olhar para esse rio
meio turvo, meio cristalino
que corta o meu coração.