QUERIA FALAR DE FLORES

Rio, 25/07/96.

Já não me atraem as flores

Nem sinto prazer nas suas cores,

Da beleza (dos olhos) estou farto

E das lágrimas, os meus, aparto.

Meu ouvido está cansado

De ouvir o falar nestes dias,

É como o chover no molhado

Ou como o sugar das pias.

Os campos me metem medo,

A relva, a meu ver, não é macia.

Se em flores falam de manhã cedo

Causam ao ouvido má digestão e azia.

Repudio a beleza das flores

E o amar dos amores

E o cantar dos cantores

E o falar dos atores.

Sinto tristeza do palácio

E do que usa a última flor do Lácio.

Do engano de varias cores

No falar dos atores.

A música minh’alma abomina,

Tocada em toda a esquina

Que fala somente em flores,

Cantadas pelos ilustres cantores.

Estou cansado das flores

Descrita pelos atores,

Cantada pelos cantores

Das flores que não são flores.

Mas se me dão flores,

As flores que são flores,

Não quero as outras flores

Nem as cores que não são cores.

As flores palavras são,

As cores o engano,

Acontecem sob o grande pano

No palco de uma nação.