A metamorfose do amor.
Se ao cantar um desejo futuro,
As palavras o fossem realizar,
Agora, no sopro do doce fole,
Brincar-me-ia com as palavras no ar.
No presente seco, um farto gole
De cachaça, para o potente Hermes,
Deixaria cair, mas deus há?
Larga-te dos seres do lar etéreo,
Volta-te a dor, pois esta é carnal:
De rubra cor e banhada por sangue.
Por tê-la apenas, perdê-la, temo?
Se ser eu, é sê-la igual também,
Só posso deixa-la, não mais sendo.
A sua fonte é infinito tédio
Das formas vivas que se apresentam.
Por mais feliz que seja o futuro
Não lhe roubarás o trono real:
- O mísera dor, não te cale mais,
Pois só tu restas-me do amor fugaz.
O amor teu lugar já ocupou,
Mas foste ele o teu pai criador,
Impossibilitado de amar,
Eu estou; pois o amor fez-se dor.