VIDA
Vida é não ter a menor idéia do que é a vida
É repetir um gesto que foi repetido
Por um bilhão de pessoas
É só pensar em 69
É a morte dos opositores
É permanecer enclausurado dentro de casa
Diante de um aparelho de televisão
É um general e um caudilho
É inquietação
É uma manifestação enorme
É uma dúvida dilacerante
É um solitário
No avesso do penúltimo sonho
Lúgubre, vazio, angustiante, colhendo a realidade
É um mártir
É um oprimido
É o canto da vida
É o aumento das coisas
É uma idéia, um sorriso, um desejo
É uma passeata
É Deus, é Jesus, é o Espírito Santo
É um canto
É a busca de algo que não existe
E de alguém que não está
É a glória desaparecida
É a infância perdida
É desencanto, é desespero
É o operário é a greve
É a celebração e a morbidez de uma fotografia
É o inóspito é o decoro
Quiçá é a rua com seus espelhos
Onde apenas um gole de bebida
É suficiente para matar a sede
É o espaço onde todos passeiam
É a gruta onde todos se escondem
É lançar um olhar ausente
Para a prostituta que nos estende a mão
É a fúria da opressão
Que atinge um povo noite e dia
É um tédio
É um absurdo
É a fome
E vida é saber
Que dentro de nós está a substância
Que nos levará ao sonho.