Minha morte
Minha morte
Quando minha morte chegar
Não chore
Comemore
Quem de nós estará ou ficará melhor
Se algum cobrador aparecer
Mande me processar
Quero ver se tem coragem
Para me procurar
Em meu velório, no caixão
Reflita
Mas diga
Nunca houve alguém melhor
Se alguém quiser refutar
fale para ir até a mim
será que terá peito
para encarar o meu fim?
Aos meus inimigos
Dê a alça do caixão para carregar
(quer pior castigo para quem só me maldisse?)
Aos maridos traídos
Ofereça um copo com lágrimas das mulheres
(Certamente, ela irá lavar o orgulho deles)
Aos meus familiares
Ofereça a conta da vida e do mundo
(Decerto, eles vão aprender o que é viver)
Às minhas mulheres
Dê o prazer de me verem mais uma vez
( talvez esqueçam o que jamais será esquecido)
Aos meus patrões
Mostre a minha carteira de trabalho
(verão o soldo poético da minha frivolidade)
Aos meus empregados
Apresente a minha rebeldia juvenil
(quem sabe, eles aprendam o que é rebelar)
Às mulheres que não tive
Conte feitos e des-feitos sobre mim
(vão chorar à cântaros por terem me negado)
Às mulheres que deixei
Oferte o presente de jogar uma pá de cal
(terão a ilusão de que se vingaram – cedo ou tarde)
Às mulheres que neguei
Deixe tocar o meu cadáver fervente
(antes tarde do que nunca para me ter)
Aos meus observadores
Peça para contar a narrativa de mim
(quem sabe, me lendo, consigam escrever a própria vida)
Aos meus amigos
Dê um convite especial para onde estou indo
(claro, poucos irão aceitar, de imediato, mas virão)
Quando a minha morte chegar
Não morra
Não sofra
Ainda ficarei perambulando em vida
Se algum político aparecer
Com discursos inflamados
Esfrie com meu corpo que jaz
gélido e também calado
em meu velório, na sala
dê o que tenho de mais caro
desperdice tudo que guardei
e distribua o meu verso mais raro
Quando minha morte chegar
A vida em quem irá chorar.
Mário Paternostro