FAZ DE CONTA

Rio, 16/07/1999.

Faz de conta

Que é um sonho

Faz a conta

E vê como ronho

Faz de conta

Que eu durmo

Faz e aponta

Qual o turno

Faz a ponta

Dessa madeira

Traz p’ra tonta

Toda a asneira

Faz de conta

Que a peneira

Traz a sombra

Na clareira

Faz tua conta

Das besteiras

Ditas por inteiras

Últimas e primeiras

Das bocas matreiras

Num palco da vida.

Faz de conta

Que não tens ouvidos,

Nem olhos para olhar,

Nem boca para falar

E mente para pensar

Só um rio para chorar.

Faz de conta

Que moras na lua

Ou ainda na rua

Faz a conta, a tua.

E aponta a nua.

Vergonha, a crua.

E sonha!

E ronha!

Caminhando na rua

Olhando a vida, a sua.

Sem perspectiva

Sem alternativa

Tendo por comitiva

Anônimos vagabundos

E também moribundos

Desfalecidos na calçada.

Faz de conta

Que não é verdade

Fecha teus olhos

A esta grave realidade

Não olhes para o lixo

Onde come o pequenino

Restos tal qual bicho.

Faz de conta

Que não é no teu país

Que é um filme de ficção

Para te fazer infeliz.

Faz de conta

Que não tens coração

Que és ser sem emoção

Faz de conta

Faz a tua conta

Põe à tua conta

E abre a tua mão

Façamos a nossa parte

Cuidemos desta arte

Para mudar esta vexação.