PÁGINAS AMARELECIDAS

Páginas amarelecidas

Pego em ti como quem pega brinquedo de infância,

Olho com a curiosidade de quem tem idade da lembrança,

te examino como ourives ao ouro da aliança

E sorrio...

Vem-me cheiro de fungos e mofos

em meus dedos de furar bolos

nas festas de domingo, amigos novos

Me dá arrepio

E abro tuas páginas como se abre janelas:

lá estão minhas dores, meus amores, todas elas

no campo das flores que já perderam o cheiro, mas ainda belas

Me enchem de brilho

Das folhas já se foram as pautas

Ficou a caderneta da infância registrando as faltas

Com caligrafia torta em caixas altas

A borracha do tempo apagou umas frases, mas não apagou o sentido...

E já não consigo

virar páginas sem molhar a ponta dos dedos (Não ria: a vida fará isso contigo também!) É por isso que estou chorando agora.

Lágrimas quentes da alegria derramam-se no amarelo do tempo

E vão lavando, esfregando meu orgulho encardido

Cristalizando a “gigante vida” em pequenos momentos

Eis que teu papel se desmancha...

Mas te mantenho firme (e doce!) como quem leva nos braços uma criança

E quando um dia a firmeza (e docuça!) me faltarem

Reacendo tuas bordas com a canetinha “vermelho-vivo”

que todos temos nos olhos

E então tu te refazes não em forma de folhas e páginas,

mas em forma de coração.