DESPALIDANDO O AMOR
O tempo torna alguns amores pálidos, mancos,
apagando seus brilhos, seus cheiros, seus gostos,
suas nuances.
Amantes viram irmãos, viram mãe e filho, virão filha e pai,
viram trastes de sangue parado.
O tempo vai travando desejos, enterrando sonhos,
dissipando brasas que tanto reinavam.
O tempo vai corroendo vontades,
expulsando inspirações, enferrujando passos juntos.
Esse roteiro vai sendo empossado no cotidiano e
quando nos damos conta o mal está feito,
o desfecho sacramentado, o cenário erguido.
Mas sempre se manterá intacta uma centelha
de paixão, meio surrada, meio assustada,
meio camuflada, mas paixão mesmo,
daquelas que escancararam tempos atrás,
daquelas que viraram gozo tempos atrás,
daquelas que viraram vida tempos atrás.
E será justamente esse teco de paixão
que ressuscitará toda paixão moída,
espezinhada, trucidada, esmigalhada,
pelas rotinas atrozes que aportaram de vez.
Daí a paixão acorda, se espreguiça, boceja,
e se levanta pra lutar.
E tudo fica paixão de novo.
Pra sempre.