FLORES MITOLÓGICAS

Nos tempos dos famosos e-groups, fazia eu parte de um onde pairavam algumas “estrelas” da literatura. Um dia um cidadão chegou com uns mequetrefes, condenando a simplicidade de alguns textos. Então lhe fiz um bem à moda baudelairiano, esperei a réplica, mas ele caiu fora do grupo.

FLORES MITOLÓGICAS

Para os caçadores de métrica e bajuladores de riqueza vocabular em detrimento da dialética platônica e da singeleza melódica da poesia.

.

Que queres tu, ególatra e mitológica criatura,

Que por mim indagas sem o querer saber?

Refutas servil antes da pergunta acontecer

Avocando o inepto direito da brilhatura.

Como os hematófagos habitantes das cavernas

Tramando o golpe às suas vítimas inocentes,

No anonimato da noite limam os seus dentes

Em generosos pescoços e suas veias externas.

Assim é teu proceder na traição aos teus pares

Na arrogância nefasta aos morcegos outorgada

Anomalia soturna na cintilante noite aviltada,

Por salivas e presas de palavreados vulgares.

Ó, Narciso, ao teu umbigo não ousas olhar!

O espelho é a tua fascinação mais íntima;

Aos amigos, a mudez das palavras ínfimas

E o lúgubre refrão “só vivo para me amar”.

De Baudelaire, envio-te as flores do mal,

De Ginsberg, presenteio-te um sonoro uivo.

Tu, que recusas olhar para o próprio umbigo,

Deixo-te Dante com sua viagem infernal.

Oferto-te um buquê de rosas rubras dialéticas

Cingidas em chumbo das balas dos canhoneiros

No último combate dos corsários aventureiros,

Dissimulados no silêncio da amplidão cibernética.

Dou-te o cravo vermelho usado na lapela

Do teu fétido e infecto paletó mortal,

Compondo as flores do teu vil funeral

De carpideiras mordazes de tez amarela.

Ofertarei uma moeda de bronze por esmola

Quando o esquife em cortejo por mim passar

Assim poderás ao barqueiro do Hades pagar

A lúgubre travessia levando-te, de vez, embora.

As veredas que deixaste não importam mais,

Nem as flores dos Guimarães por ora maltratadas,

Rosas silvestres, melancolicamente despetaladas,

Orquidácias negras remanescentes das Gerais.

Este é o meu réquiem embalando tua catatonia,

Confortando tua negra alma no barco de Caronte

Antes do encontro final com diabos monocerontes

A quem prestarás contas das arrogantes vilanias.

Maceió, 09 de agosto de 2004.