UMA ENGRENAGEM ANTIGA
Fosse eu uma máquina de Deus, bem azeitada e eficiente
Talvez já tivesse dado pino e mofado num canto
Fosse talvez mais sagaz que o câncer teria eu evoluído como ele?
Fosse minha juventude menos desperdiçada e vulgar seria eu um ser menos tácito?
Qual semblante talvez me teriam vendido naquela liquidação de prazeres e jogos tão populares?
Foste você ou eu?
Que me importa o autor senão o crime...
Que qualidade eterna tem uma máscara?
Fosse ela bela ou caricata...
Num prazo indefinido todos caímos
Pra ressurgimos como inspiração ou piada
Partes de um retrato e fragmentos de uma memória coletiva
Fosse sincera ou não...
Qual a relevância?
Uma lenda não morre, mas todo o resto sim...
As areias à tudo soterram e os relógios nunca param
Feixes de luz sobram num quarto inabitado
Mas onde há escárnio certas bênçãos se retratam
E todos somos passíveis de um convite e do vício que vem depois...
Não fosse a velha coerência
Qual e tal uma engrenagem antiga e dócil
Calibrada num tempo preciso e afinada numa era de razão.