Auto-retrato
Havia perdido meu rosto na viagem,
deixei do outro lado da rua minha roupas
deixei impressões no bar
e uma contínua vontade de que a vida fosse diferente me persegue.
Ser alguém menos estranho,
nem reflexivo e nem superficial,
na medida certa,
sereno,
sem revolta, sem ambição,
com muita coisa para se fazer.
É tudo que eu queria ser!
Não sou assim,
nem mesmo à noite
pior ainda de dia.
O céu de minha casa é vermelho,
o vestido de meus lábios é roxo,
muitos calos nas mãos
pedras no peito
e um poderoso finito nos meus cabelos,
nunca pretendi mesmo fazer tranças.
Muito embora muita graça escondo
Habita em mim cárceres.
Pela pintura do quadro desenho minha trajetória,
mas ninguém me acompanha.
Não entro no carro e nem penso pegar ônibus,
vou andando mesmo
pelo passeio
pela calçada suja
pelo vento,
pedindo ao sol por nuvens
rogando as nuvens por chuva
que a chuva me molhe
sem deixar restos.