TEMPO DE SORTILÉGIO * O elogio do poeta

Poeta sem diploma que te valha

nem estatuto que te recomende

na feira franca do consumo espalha:

um verso não se compra nem se vende.

Que a tua voz ressoe como um grito

e assombre ou incendeie a multidão:

um verso nunca pode ser maldito

se nele fala livre um coração.

Rebelde, o verso nunca se conforma

com o silêncio inerte da mortalha.

Se amante, faz da vida a sua norma,

que tão-somente o puro Amor lhe valha!

E o verso seja enleio enamorado,

quando, pela tardinha, o sol declina,

ou seja, ao meio-dia, um sol irado,

quando inclemente cega a tremulina…

Ou seja, no fulgor da rebeldia,

a mesa, que sem pão, protesta -- basta!

Ou seja o rio, em louca correria,

que além das margens cresce e tudo arrasta!…

Que um verso seja um verso além da rima!

Que além do metro e ritmo, seja tudo!

Importa que o poeta se redima…

…e a redimir-se nunca fique mudo!

José-Augusto de Carvalho

9 de Janeiro de 2019.

Alentejo * Portugal

José Augusto de Carvalho
Enviado por José Augusto de Carvalho em 09/01/2019
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