Passageiro
Acordei em um pesadelo
Vi, então, que meu sonho era belo
Negra era a realidade que vivia
Virei de lado
Tentei dormir novamente
Mas a consciência não o permitiu
Não consigo mais dormir
Não posso ficar calado
A realidade se extrapolou
Superou meus mais tristes sonhos
O pesadelo esperado, anunciado
Que ninguém quis nem sonhar
Aquele que a gente afasta do pensamento
Finalmente, infelizmente, aconteceu
Antes havia paz,
Enquanto dormíamos
Sabíamos que o mundo girava
Que as pessoas viviam...
Mas, agora, estou incerto
Vejo a dor e a morte tão perto
Que, desperto de belos sonhos
Tenho calafrios ante a realidade
Que infortúnio, o do brasileiro
Que infeliz a nossa gente que sorri
Que dor essa que me assoma ao peito!
Quando a gente embarca numa nave
Nunca pensa em quem vai comandá-la
A gente pensa nos compromissos
A gente pensa nas alegrias,
No retorno...
Será tem razão quem irracionalmente
Deixa-se conduzir pelo medo?!
Recuso-me a acreditar
Mas – devo admitir – estou com muito medo agora
Sinto-me uma criança órfã
Sabe? A criança que se sente odiada
Desprezada, abandonada?
É assim que me sinto, como brasileiro
Meu voto foi em vão
Dele, ninguém se lembra
Nem eu me lembro mais
Para quê? Sinto-me descartável
Mas não me esqueço do medo alardeado
E penso: coitados dos que ficaram
No meio do caminho...
Que Deus os acompanhe
E nos acompanhe em nossa jornada
Estúpida, vã e maldita
Os brasileiros são uma multidão de sozinhos
Somos gado nos olhos de seres vis
Que nos vendem, se não nos escarnam
Ai, meus bravos brasileiros
Que dor me assoma agora!
Caímos em mortal armadilha
- Me tirem daqui! – ouço dizer
Que posso fazer?! Que devo fazer?!
Dizem que o comandante nunca abandona a nave
Mas, e se ele não souber governá-la?
Então, que ele saia primeiro!
Antes que se perca a nave
Antes que pereça o passageiro.
Vamos gritar! É o que nos resta.
Até a última mancha de sangue!
Até a última réstia de carne!
Até a última gota de lágrima!
Acorda, passageiro!
A nave está desgovernada:
O país inteiro.
D.S.