Lição de pai

Perguntou à esposa sobre o pagamento do seguro. Ela respondeu com olhar reprovador. Seguiu para o centro da sala, deitou-se no chão e fechou os olhos. Chamou os filhos que riam dizendo que papai estava dormindo. Ele disse aos filhos que inventou uma brincadeira. Que ele ia se fazer de morto, mas, enquanto estivesse com olhos fechados, os filhos poderiam perguntar o que quisessem, que ele responderia. Um dos filhos disse que, se seu pai morresse, ficaria muito triste. Disse que não queria essa brincadeira. Mas o pai insistiu e disse que estava só brincando. A esposa o chamou de idiota. Qualificando de ridícula a brincadeira. Ela mesma, involuntariamente temerosa. O outro filho fez cara de choro. O pai reagiu. Disse que era natural ficar triste. Que deveria perguntar a seu avô como tinha ficado ao saber da morte de seu próprio pai. No início, a gente fica mesmo triste, mas que a tristeza logo acaba. Vovô não era feliz? Então. Outro filho disse que ficaria sozinho, que seu pai não lhe compraria mais brinquedo. Ele retrucou dizendo que sua mãe resolveria tudo, desde que abrisse o coração com ela. Se estivesse triste, ou se estivesse sozinho, ou se quisesse alguma coisa, que ela sempre estaria ao seu lado, como melhor amiga. O menor ameaçou soluçar, fazendo bico com os lábios. E o pai disse que, quando eles menos esperassem ia abrir os olhos e dar um “buuu!”, os assuntando. E continuaram a conversa. E o pai ameaçando: “Acho que vou levantar agora”, formando garras com os dedos. “Ah, não! Agora não!” Os meninos clamavam indecisos entre o medo e o sorriso. Por fim, ele abriu os olhos e correu atrás dos meninos e os abraçou. Seus gritos tomaram conta da casa. Ajeitou a camisa para dentro da calça e endireitou a gravata. Beijou os filhos e se apressou para apanhar o táxi que o esperava. O filho mais velho ensaiou chorar. “Por quê?”, perguntou o pai. “Você não pode morrer, pai!”. Os olhos marejados. “Mas que guri medroso! Que morrer, que nada! Volto amanhã, meu filho..., se Deus permitir”.

D.S.