DO MEU MEDO DO NADA

O meu medo é ser fluido.

Ele não olha apenas do lado

Porque nunca conseguiria enxergar-se

Só lado a lado de mim.

Também nunca olha só para trás

Do mundo,

Apenas segue adiante do que assusta.

Não é o ato isolado

O tiro disparado

O grito soado no ar.

Não é só o tempo apressado

O beijo negado

O amor sonegado

O rio assoreado.

O meu medo,

Não é apenas o da pétala desgarrada

Pela brisa mentirosa

Cujo todo da flor sem vida

Agoniza no tapete

De primaveras suadas

Descoloridas

Empedernidas.

O meu medo não vem da palavra que ouço

Ou da que não ouço,

Embargada nas letras

Que nunca puderam existir,

Discorridas a vácuo dum tempo que grita.

O meu medo não é só

O de criança assustada

A espera dum milagre das mãos.

Não se trata o meu medo

Dos fantasmas das óperas inacabadas das ruas

Tampouco meu medo é covarde que desistiu

Andarilho das rotas de fuga das calçadas.

O meu medo

Não está no palanque falacioso

Tampouco no púlpito da fé encenada

Que grita redenção à Humanidade.

O meu medo nunca é visto

Tampouco sentido

Porque hoje

Já não há tempo de se voltar

Ao medo alheio.

É preciso carregar medos em silêncio confesso.

O meu medo seria nada

Se fosse apenas tudo isso.

Então ,

É a poesia quem me obriga

A rotear meu sentimento

Enaltecer meu medo

Nas rotas do nosso todo real.

E eu preciso dum verso

Que verse

Que meu medo

Não é transeunte

Pelas ruas esquecidas

Nem está ao alcance de ser apaziguado.

Meu medo...

Ele não pede socorro a ninguém

Porque aprendeu a coexistir sozinho.

O meu medo dorme ao relento

Bem barulhento

A incomodar o vento que passa

Pelo turbulento murmúrio

Das estações frágeis…

O meu medo

Se transfigura em sentido

Em cada olhar que passa distraído

De direções

Pelo só encenado singular e caótico pluralismo.

O meu medo pede por um sorriso…

Ainda que premente e

Entredentes…

O meu medo pede por acordadas mentes.

Ora gentes…quantos seres robôs,

Físicos nunca metafísicos

Nesse universo de inconscientes

Devorados pelos medos

Automatizados.

O meu medo é assim…

Medo algo robótico,

Num conjunto vazio

De versos mudos em plural

E como tal

Medo indivídualizado no descoletivo humano

Que já não consegue ler nos olhos

Toda a amorfa medrosa poesia que escapa.

Medo ,

Da franca e cáustica

Anestesia carregada que brota

Na carroceria dum tempo

Que segue sem rodas…

Carroça de esquecidas gentes

Plenas de almas frias

E perambulantes do nada.

O meu medo é assim

Docemente amargo

Consciente inconsciente,aliviado

E perene de versos urgentes.

O meu medo sou eu.

Assim...

Como se é

O ser intangível

A dar vida e força

À toda medrosa poesia que passa...