Poeta que é poeta
Poeta que é poeta
tem a chave que escancara o coração dos homens,
entrando e saindo sem bater na porta,
nem se fazendo notar.
É criatura de alma farta,
com salvo-conduto pra matar quem bem quiser,
só com veneno das suas palavras,
só com o alçapão das suas frases,
só com o cadafalso do seu pensar.
Poeta que é poeta vive em estado de graça,
meio de porre, meio drogado, meio extasiado,
pra poder brincar com seus escritos sem rédeas,
sem medo, sem limite, sem regra.
É obra escolhida pelo Criador
pra levar ao mundo o que gostaria de dizer
e nunca conseguiu.
Poeta que é poeta já nasce velho, curtido.
infestado das rugas do caminhar,
entulhado de cheiros, gostos, texturas,
que vai parir através dos passos da sua arte.
Poeta que é poeta conhece todas catacumbas
da paixão, todos rincões da saudade,
todos descampados da solidão.
Sabe melhor que ninguém
onde estão as vísceras do gozo,
o pulmão da felicidade,
o porto escondido da fé.
Poeta que é poeta não tem lar,
não tem raiz e nem tampouco gera frutos.
Sua nômade razão de ser
o empurra para os relentos da vida,
se inspirando no céu aberto,
nas sombras dos medos,
nos poréns mais aguçados da razão.
Poeta que é poeta não morre nunca,
não se sacia nunca, não estanca nunca.
É nele que todos os seres vão recarregar
seus sonhos, seus sangues, seus ossos,
sua paz e seu suor.