Filhos como de fato são
Quero falar deles
tão aguçadamente desejados
tão suormente feitos
tão divinamente contemplados.
Trazidos ao mundo pela nossa mão
placidamente colocados nesse chão
aninhadamente recebidos
com todos cheiros, gostos e texturas
que couberem na nossa alma.
Fizeram brotar na gente a felicidade dos mundos,
a divindade dos mundos,
a bênção mais infinita dos mundos.
O rio corria no seu curso sem medo,
sem rebarba, sem trava, sem cabresto.
cumprindo seu ofício com colorido respirar,
extirpando sombras dos nossos passos,
mandando embora as dores mancas da fé.
Até que, num belo dia,
quem se dizia fiel, some da raia,
quem se passava por doce. vira tumor,
quem se fazia brilhar, podre fica.
O coração se despedaça, se tritura, vira pó,
as ideias cambaleiam, perdem o rumo, esgarçam,
o bafo da traição é demais para o nosso porto.
Dá vontade de jogar nossos olhos fora,
dá vontade de arrancar nossa alma de vez,
dá vontade de sufocar o sangue até morrer.
Eles que outrora se faziam passar por queridos,
que outrora eram nossa varanda mais arejada,
agora só querem vigorar seu desprezo,
agora só querem premiar seu adeus,
agora só querem ecoar seu pouco caso,
num ímpeto que faz o diabo invejar.
Agora os entendo como de fato são,
agora os traduzo como de fato são,
agora os choro como de fato são.
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inspirado nos meus filhos