rascunho

Ler livros não te faz melhor. Saber interpretá-los, sim. (Karl Marx)

E para que possamos antever a configuração do movimento que a rebeldia latente da juventude eclodiu naqueles anos de chumbo vamos pegar um gancho da fala corretíssima do nosso querido Aragón Guerrero num comentário ao não menos corretamente posicionado em sua trincheira de letras, Yamânu (No Estado Democrático É Fácil, Mas no De Exceção É Impossível); Não tirem a medida com o mesmo metro. Não se atravessa um abismo (como uma ditadura aos pulinhos); se guerrilhas ouve e ouve (foi para combater a ditadura) e não ao contrário como apregoam. Não confunda a reação do oprimido com a violência do opressor. Do rio que tudo arrasta se diz que é violento. Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem... Bertolt Brecht.

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UM TRAGO, mais um trago e muitos outros tragos...

É preciso estar sempre embriagada para suportar a aridez deste nosso tempo... É preciso estar sempre embriagado. Aí está: eis a única questão. Para não sentirem o fardo horrível do Tempo que verga e inclina para a terra. (Charles Baudelaire)

Vermelho, de João Guimarães Rosa

Encena-se uma sexualidade ativa, corporal, transbordante, libidinal, quente, viva, latejante, pulsional

É uma pomba

— parece uma virgem.

De debaixo das plumas, vem o jorro

enérgico, da foz de uma artéria:

e a mancha transborda, chovendo salpicos,

a cada palpitação.

Cresce, cresce,

parece que meus olhos a tocam,

e que vem aos meus olhos

passando por meus dedos,

viva, tão viva,

que quase grita…

Ardente e berrante…

Como deve ser quente!…

Mancha farta, crescente, latejante,

dói-me nos olhos e me irrita…

Cresce, cresce,

tão depressa,

que chega a mudar o gosto na minha boca…

Tenho-a agora presa nos meus olhos,

quente, quente,

e no entanto a pomba já está fria,

e colorada, como uma grande flor…

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Encena-se uma sexualidade ativa, corporal, transbordante, libidinal, quente, viva, latejante, pulsional. A “pomba” do primeiro verso — comparada de imediato a uma virgem — pode-se ler como “pênis” e como “vulva”, ambas as acepções encontradas no Aurélio e no Houaiss. (Recorde-se, aliás, o nome da personagem azevediana Pombinha, de O cortiço — jovem, lésbica e prostituta.) Já a flor, “fria”, faz retornar um tópos clássico na literatura, que recria, antropomorfizando, no imaginário poético, este “órgão sexual da planta” — a flor! Em síntese, do jorro enérgico da pomba virgem à frieza final da flor, parece que presenciamos uma solitária e insinuante ação erótica, mormente onanista.

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Serpente Angel
Enviado por Serpente Angel em 27/10/2018
Reeditado em 27/10/2018
Código do texto: T6487345
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