Destino e outra igual

Destino

Queimado

na fogueira dos covardes,

dos desgraçados

Eu fui jogado

Eu, menino pequeno,

olhos azuis claros

Pele rosada e nariz arrebitado

Como um anjo do altar cristão

Fui amaldiçoado

Tiraram a minha alma

Me transformaram em um escravo

Desde miúdo, usado

Minha mãe, ao lado

Contando os poucos centavos

Eu, pobre, branco

E agora me acusam do que não fiz

Fui vítima

Nada mudou

Continuam a me oprimir

Era o início de outro século

Os ternos e os vestidos longos

As elites cansadas

Esqueceram de mim

Bato pedras e o trem escurece os meus horizontes

Com sua fumaça tóxica

O progresso que não veio até mim

Os meus pulmões destruídos

As mãos tórridas de carvão

Os monges, os seus mantras não chegam até mim

O meu brinquedo é um martelo

O meu sonho de subalterno

De acordar deste pesadelo

Esfrego os olhos com as mãos

E ainda estou aqui

Eles não são honestos

Nos enganam

Nos mandam

Para o necrotério

Cedo demais

Para deixar de existir

Queria ser gato [confissões de um veneno perturbado]

Pra ter essa habilidade

de ouvir os ''macacos'' humanos falarem

E não entender

São tantos que não merecem esse esforço

São tantos que não têm zelo pelo outro

São tantos que poderiam nascer mudos, se já são ocos

São tantos os [essencialmente] estúpidos

Vamos todos morrer

de qualquer jeito

Queria ser gato

Ter olhos bonitos

Rosto perfeito

Passar o dia me banhando

sossegado

Brindando a vida

Sem saber

Mas tenho que lidar com falsários

Servidores do diabo

Deste poder