NADA SEI

eu não sei escrever palavras sem sons

eu também não sei da razão de a pedra existir

no caminho

nem das flores mortas esquecidas

no chão

nada sei a respeito das portas sem trancas,

tampouco das janelas fechadas ao vento

das ruas vazias

das paredes sem memórias

nada sei sobre os grãos de areia que formam

o deserto, numa cumplicidade trágica de sussurros

e nada sei das miragens formadas na solidão dos beduinos

dos lobos que uivam, nem das tempestades de silêncio

nada sei do mar que não seca

nem dos rios vivos que caminham deitados

sobre a terra

nada sei dos malabares das cascatas no jorrar de águas feito pranto

eu também não sei o porque do voo e do canto

dos pássaros e das aves noturnas

das mariposas que voam na escuridão da noite

nem da luz dos vaga-lumes na negritude das florestas

eu não sei porque o peito grita e pulsa feito velas ao vento

e chora simulando despedidas

eu não sei porque a lágrima escolheu fazer um só caminho

sem retorno a foz como faz o rio

e eu nada sei de ti

nem do teu corpo

nem dos teus olhos que imagino-os crus

nem da cama onde deitas

nem do relento que te abriga

e fico por muito tempo a contemplar dentro de mim mesma,

uma esfera estática

longínqua

uma imagem que me inspire,

um lago que me contemple

Margarida Di

Margarida Di
Enviado por Margarida Di em 14/09/2018
Reeditado em 14/09/2018
Código do texto: T6448200
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