Querer

Querer escrever poesia ainda não é poesia.

Tratar a palavra como a uma criança recém-nascida,

com todo cuidado e devoção,

também não é fazer poesia.

Tratar a emoção como fonte sagrada de inspiração,

é assassinato, jamais poesia.

Dar aos pequenos detalhes o protagonismo

que só merece o verso bem-acabado,

é indecência, não poesia.

A escama de cobra, a perna do sapo e o olho do jacaré,

a asa da borboleta e a do morcego, o nado da anta

e o ataque das abelhas, o caminhar da onça,

a sapiência da coruja, o lodo do rio,

o sono da pantera... nada, nada disso é poesia.

Talvez só a Bandeira, de Manoel, seja poesia

talvez a involuntariedade do “bom dia!”

à toda essa fantasia da fantasia (talvez nem isso).

Grouchesco
Enviado por Grouchesco em 24/08/2018
Código do texto: T6428303
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