1959
que teu corpo era o meu ópio
isso é óbvio
só não dizem as entrelinhas como me libertei
contigo quando me deitei
subitamente amanheci só
era o meu o corpo mal acomodado no chão
eram todos teus o travesseiro e o colchão
a mim me confortava o assoalho
o frio que me estalava os pulmões redimia
perdão pelas altas doses de apatia
mas não estava em dia de resistir
deixei-te de herança o vazio neonato
a lembrança dei de comer aos ratos
às baratas as migalhas
nunca mais sucumbiria ao teu peito
nem ao perfume doce do teu pulso direito
e do esquerdo
nunca mais desceria aos teus pés
transferi minha reverência ao brandy e ao café
teu altar pus à venda
nunca mais pensaria não haver caminho além de ti
só não sei ainda se existo ou se existi
pois não sei o quanto de mim roubaste