O PRÍNCIPE DE TODAS AS COISAS
Quando a maré subir quero você me dizendo coisas puras
Quando ela descer e estivermos salvos espero que flutuemos
E nos abandonemos... mas não mutuamente
Quando as coisas ficarem negras como uma noite de inverno sem estrelas
Conto com sua música e seu cinismo
Quando formos daqui até a eternidade aguardo o que chamam de presságio
Pois necessito de preparação e fôlego guardado
Minha alma fraca e meu decrépito anseiam por combustível
Quando eu descer até o último andar, o mais próximo do abismo do gelo e da escuridão absoluta
Faço questão de ter seu abraço antes
Quando meus sonhos lúcidos virarem insanidade
E minha loucura for minha normalidade
Serei grato caso possa-me dar um oi da sua torre de marfim
Quando nos separarmos e eu ver você diminuir no horizonte até esvanecer
Aí eu terei certeza de que nada fiz e que nada sou
Quando eu soluçar e o silêncio me engolir como fez tantas vezes
Como uma refeição mal-digerida
Como a marca do carrasco
Como uma prece antes da execução
Quando formos iguais em ânsia e similares na doença
Farei um testamento e o queimarei em seguida
Pois não deixo nada além da minha tristeza
Quando for meu dia de partir para o segundo nível
Olharei pra trás e espero ver seu aceno
Quando minha pele ficar tão macilenta quanto meus pensamentos
Aí você fará um verso e eu ouvirei atento
Até lá estamos num paralelo distante
Numa linha divisória
Num buraco negro estudando a antimatéria
Quando finalmente nos ouvirmos e calarmos diante da prosa do outro
Talvez seja tarde demais
Talvez seja a hora de nos calarmos e desistirmos
Talvez o silêncio, o príncipe de todas as coisas, tenha vencido
Com a mais inexorável das armas
Quando isso acontecer eu então gritarei apenas pra quebrá-lo
E depois o aceitarei como o velho amigo que sempre foi.