PELO ENSAIO DA ÚLTIMA VEZ

Quando ele surgir na linha do hoje

Como um sol manso e supremo...

E sob Suprema ordem!

Ele nunca saberá

Mas poderá ser

A sua última vez.

As flores sob ele

Estarão chegando

Espevitadas e ensolaradas

Até que, hora a hora

Alheias ao tempo atemporal

Floresçam sua última pétala

Em meio ao último pistilo da Graça

Flor de útero imutável...

Nunca estéril de força e viço

Até o último perfume genuíno

Das ilusões de se florescer ser único.

E poderá ser ali, a sua última vez.

Um passarinho

Solto a esmo do existir

Soará seu canto forte

como se eterno fosse,

Até a sua última vez

de cantarolar

Na derradeira nota

Perene, em doce e suave Música de Câmara.

Sempre sem nunca saber como

Nem onde, nem porquê existiu.

Nem até quando.

E poderá ser tudo isso pela última vez.

Toda a relva

Saboreará o forte vento

Que só parecerá infinito,

Mas que tão breve já se faz brisa.

E todo deguste do tempo

Poderá ser sentido até o fim

Sem saber, quiçá, o ser pela última vez.

Enquanto isso...

Um peeling de pele

Descama as últimas células mortas...

das aparências inaceitáveis

sem nunca remover

a aspereza das tantas almas rudes.

Por um milagre, quiçá, poderá ser pela última vez.

Tudo isso para que

Mais um discurso soe bonito

Sempre em tom de prece

Até a última vez insana do Homem

Vez última que nunca chega

para a herdada loucura!

De se ser um ser

de perpétuas vozes não críveis...

Então,

Algo insistente soará sobre “deus”,

Só mais um “meio de vida ignóbil”

Dentre tantas invenções de primeiras vezes.

Meu Deus!

Quantas vozes que hipnotizam as direções,

Nos palanques vaidosos

Das vis bondades arrogantes.

Haveria-lhes uma última vez?

Nessa hora,

Eu sempre torço por ser a derradeira vez:

Ou das suas garganta ou a dos meus ouvidos.

Blindo o coração:

Quem saberia?

Eles parecem ser os últimos a não saber:

Que as últimas vezes podem ser as nossas.

Derradeiras chances conjuntas de vez prima

Idas...tantas vezes pela última vez.

Depois, qual nariz dum cão farejador

Sinto um barro fétido correr pelas sarjetas

dos escombros,

Como massa afônica e amorfa dos abandonos

Que aguardam pela última vez!

Quantas últimas vezes negadas

aos que sequer tiveram a sua primeira chance.

Nunca existe última vez para as inexistências...

Olho para o céu alheio a mim

E ao tudo de nós todos!

Onde arquiteturas de nuvens passam

Pela última vez, será?

A desenhar figuras desumanas

Qual as dum apocalipse em ocaso

Magnífico jogo de cores fortes e desgrenhadas,

cubistas até!

Como o lusco-fusco dum inferno...

Desenhado em óleo quente

Sobre as telas mórbidas das últimas vezes.

Quem saberia decifrar?

Acima do céu dos homens

Muito mais que sete cabeças monstruosas

Desfilam em coreografias mansas e traiçoeiras

Todas em sincronia perfeitamente desconstruída

No descaso perplexo com telas alvissareiras.

São genomas pútridos das últimas vezes perdidas.

Telas de "última vez" nunca sobrevivem sozinhas.

É quando

Para além da tênue linha do horizonte

Sempre muito além do todo donde o sol nasce...

A enxergo no milagre de deusa suprema .

De batuta na mão,

Maestrina e poetisa das horas...

Eis a Eternidade!

Bondade sempre disposta a um novo ensaio

Do nosso último (e útil") recomeçar.

É quando sei que já não mais nos existirá última vez.