AO SILÊNCIO
O poema do silêncio
é o poema de uma vida
descolorida, longa
que em alguma travessia,
cruzamento ou trilho
perdeu o encanto
despiu-se da paixão
encontrou a dor
acomodou-se com a solidão.
O poema do silêncio,
ao contrário do que se pensa,
tem sons por companhia:
o rabiscar do lápis sobre o papel,
o virar das folhas repletas de palavras,
o uivo de um cão carente
longe... tão distante
como o som da alegria de outrora.
O poema do silêncio
é entrecortado de choro,
soluços e suspiros saudosos
lágrimas que pingam incontidas
sobre desbotadas fotografias.
O silêncio habitual, familiar
inspira uma canção sofrida
a pintura eternamente inacabada
versos que serão relidos pelo poeta
(e por mais ninguém)
nas madrugadas insones, silenciosas.
*Publicado na coletânea Palavra é Arte (2016) e na Antologia de Prosadores e Poetas Brasileiros Contemporâneos (2017).