Andarilho do deserto
Lá em frente
É um lugar
Onde eu pertenço
Ou só uma miragem?
Nada que não valha a pena
Dar passos dolorosos
Ao caminho de uma certeza
Ou de uma certa ilusão.
Me canso de todos os cantos
Em que olho são
Confirmações sobre a incerteza
De ao menos houver uma saída
Deste deserto
Em que as alucinações tomam conta
Do que antes estava longe da loucura.
E minha visão me trai
Me faz acreditar
Que tudo está mais perto
Do que realmente está.
Assim é o amanhã
Meus olhos quando olham para as horas
Dizem-me que falta pouco
Para que o sol se abaixe
E a lua se levante.
E de que toda poesia
Seria esquecida
Em uma passagem de dias
E uma mudança nos astros.
Mas devo estar cego
Pela tempestade de areia
E desmoronando-me de joelhos
No solo quente
Que é a única coisa que me abraça
Sem receios de segundas intenções
Quando falho e caio.
Devo evaporar
Virar fumaça
Sair da superfície
E sumir no ar.
Ao menos
Seria uma boa conclusão
Em uma história
Que há muito tempo
Cansei de participar
Como o fruto de uma tragédia
Como um mártir.
Quero sombras
Para que eu possa
Me esconder embaixo delas
E me proteger
Do calor que é
Ser um andarilho
Do um deserto
Em que eu mesmo me coloquei.
Sentir que no final
Há uma uma certa paz
E algo que eu possa desfrutar
Da temível solidão.
Coloco as mãos
Encima das sobrancelhas
Para que a luz
Não se torne um fardo
Que terei de carregar a mais
Quando estiver perto
De encontrar um caminho
Na escuridão.
Velejei por seu oceanos
Enfrentei suas criaturas
Conheci-o mais que eu
Compreendi-o após um tempo
Montando o quebra-cabeças
Com os pedaços da minha mente.
Até que me dei conta
Que nunca encontraria
O caminho de volta para casa
Pois já havia me fissurado
Em só andar
E chegar a lugar algum.
Deito-me no chão
E deixo que a areia
Seja um cobertor
E conforte-me para dormir
Em um lugar onde ninguém
Poderá me encontrar
E ninguém poderá me ouvir.
Quando eu desaparecer
E me tornar parte
Das ruínas do deserto
Que esconde muito mais
Que seu vazio mostra
Perceberei então
Que é aqui que pertenço
Afinal
Ele é assombrosamente
Assim como eu.
E quando foi
Que eu me perdi
Em mim mesmo?