Todas as bombas do mundo

Todas as bombas do mundo caíram hoje... Caíram sobre a minha cabeça,

caíram sobre a cabeça dos reis sobre a cabeça de todos;

caíram bombas e explodiram morteiros,

inundaram o quintal da minha casa de chumbo e de pólvora.

Ninguém sobreviveu ao ataque químico e à ofensiva com gás letal.

Hoje o dia inteiro não se ouviu outra coisa na vizinhança

a não ser as explosões horrorosas

e os chiliques das granadas de mão

e das bombas de toda ordem

caindo nas casas das famílias durante as refeições.

Os aviões lançavam dezenas, centenas, milhares de torpedos...

Olhando para o céu eu via as ogivas nuas caindo e criando asas,

com a visão ofuscada pela fumaça e pelo pó das construções em ruínas

ouvia o torpedo atingir a igreja, via o medo nos olhos das crianças

e o terror que frequentava minha alma quando a terra tremia.

Cada bomba que beijava o chão, cada grito, cada choro,

cada corpo soterrado nos escombros,

cada assombro noturno provocado pelo sobrevoar afoito dos aviões a jato,

cada fuga bem sucedida, nas sucessivas fugas necessárias para escapar,

cada dia a mais de sobrevida... Tudo importava.

Aquela foto que salvaram antes do teto desabar.

O objeto por mais insignificante que parecesse a todos.

Cada segundo no quintal regando as flores, sentado no terreiro,

olhando o cachorro enlouquecido, enlouquecendo

com o barulho dos morteiros.

Só de imaginar o sangue nas mãos das pessoas,

a garganta seca, a expressão de horror em suas faces,

só de imaginar a fome, o medo, o pânico que sentiam

me senti paralisado com tamanha crueldade.

Não há humanidade em territórios sitiados. A guerra é o fim.