Coca-Cola com veneno de rato e limão capeta

Morri aos quinze anos de idade.

Não me lembro muito bem do motivo da minha morte na ocasião.

Na noite daquele fatídico domingo,

abraçado com a enorme dor que me consumia,

saltei umas dez vezes do cume mais escuro da minha existência.

Enquanto eu caía,

pude sentir as dores nas vozes gritadas

e o sofrimento das cordas da guitarra nas distorções insensíveis e frias

que ressoavam tristes enquanto vibravam e reverberavam

através dos meus fones de ouvido.

Os mesmos fones que me protegeram em vida

e que se espatifaram mudos na solidão do meu travesseiro,

na agonia da minha jornada de pesadelos madrugada adentro,

até o desembocar na segurança da manhã seguinte,

quando o sol veio me consolar.

De todas as dores sentidas à época, a de segunda-feira,

dia seguinte ao incidente, foi a mais dolorida.

Mais até do que a dor da véspera, em tom de despedida.

Pareceu-me a morte, pareceu-me que não pararia, pareceu, parecia...

Nada comparado às feridas de agora, é claro, nem à escuridão de ontem.

E pra minha infelicidade, duas décadas depois, o meu corpo ainda está em queda livre.

E a escuridão que me habitava as noites, jamais se fez luz, um diazinho sequer.

Pior... Agora dá expediente também durante o dia.

Hoje, faz vinte e um anos que morri pela primeira vez,

e desde a minha última partida, essa é a primeira vez que comemoro em vida.