NA TERRA COMO NO CÉU

Dentro da terra,

há terras de anjos estranhos,

tão quietos, que folhas pousam

entre seus cabelos de todas as cores.

São de todos os tamanhos e seriam belos

não fosse essa face única,

essa face esgarçada, feito nuvem ao vento.

Além de qualquer afoiteza,

têm um azul dolorido, de carne que se bateu,

um amarelo antigo, de milho que se perdeu

além de qualquer beleza.

São anjos estranhos de terras distantes

que nem vivem o viver dos viventes,

são anjos de todo tamanho.

São homens,

se homens, anjos pudessem ser.

São meninos,

é assim que os anjos têm sido.

E brincam entre flores de um jardim,

só por eles conhecido,

de amores-perfeitos seráficos,

vitórias-régias impossíveis,

lânguidas flores-de-cera

e líquidas ninféias,

todas feitas de nuvem.

A terra dos anjos estranhos

é terra presa, pisada.

Nela, pedras não rolam.

É seca a terra de tantas botas que pesam.

Cinzas cobrem a terra,

cinza é cor das botas.

Ainda assim, para os anjos,

são flâmeos

e velam de vermelho seus olhos

(o vermelho de uma infâmia).

Depois do vermelho quente,

nos ouvidos dos anjos,

para sempre,

os versos mais tristes de uma nênia.

(Há tanto vermelho cobrindo a terra!)

Saramar
Enviado por Saramar em 30/08/2007
Código do texto: T630138