Hamlet nordestino (Adaptação)
Rapaz, é ou não é, tá aí a pergunta:
será melhor levar na cara
os coices e as chicotadas que a vida nos dá,
ou perder as estribeiras contra esses desmandos
e pelejar com peixeira na mão pra acabar com tudo? Morrer... dormir:
E pronto! Dizer que com uma boa dormida findamos
essa gastura no juízo e esse montão de mazelas
que aperrai o caboclo de perto, e essa é uma solução
altamente desejável. Morrer – dormir...
É! Dormir! Sonhar, quem sabe. Só que aí tá a bronca!
Esses sonhos que vem com o sono da indesejada
quando a gente sair desse muvuca toda
nos obrigam a ficar com um pé atrás e ficar matutando nisso
é que dá pra tristeza uma vida assim tão longa.
Veja bem, que suportaria as pauladas e xingamentos do mundo,
a afronta dos grandes, o desprezo do orgulhoso,
a dor de corno, o lenga-lenga da lei,
o atrevimento dos políticos, ou as coisas
que gente boa tem de suportar dos incompetentes
podendos eles mesmos acabar com tudo
na base da peixeira? Quem suportaria o peso,
se lascando que nem um jumento,
a não ser porque o medo do que vem depois da morte –
terra desconhecida e de onde
nenhum viajante voltou – nos azucrina o juízo
e nos faz preferir deixar quietos e suportar a lida
do que arrumar mais sarna pra se coçar?
E é assim é que pensar nos deixa frouxos.
E assim a forma normal de decidir as coisas
fica essa coisa velha pálida por pensar demais.
E quando o camarada decide criar vergonha na cara e coragem,
por pensar demais, acaba saindo do prumo,
a já não pode nem mais se chamar de ação.