Eu que pensava ter parentesco com Hermes

Eu que pensava

ter parentesco com Hermes,

o sagrado mensageiro

de asas ligeiras no calcanhar,

tombei, cai, e parei.

Minhas supostas asas

provaram inutilidade quando senti

o peso do mercúrio e outros metais pesados

a estancar e entupir e subordinar orações simples.

É preciso encarar os fatos:

coisas ruins acontecem na vida de pessoas boas,

o ladrão pode ter melhor sorte que o honesto,

crianças inocentes morrem,

doenças não são pragas,

acidentes acontecem enquanto a filosofia se dedica

a encontra a verdade para vida que continua

sempre despindo cada um de nós do orgulho.

Mas qualquer um pode ver, basta reparar,

ali estão asas possíveis;

a meio caminho do poema por deus dado

outra via, esta, a vida possível reinventada.

Hoje ando com dificuldade,

por isso escolho bem onde piso,

me equilibro entre os dias, vivo um por vez;

mas alegre por compreender

o milagre da reprogramação.

Se lhe pareço fora de foco, não vejo crise,

eu não pretendo representar tanta nitidez.

Quem me vê sorrir não pergunta,

nos faz bem não saber tudo.

A notícia é esta, toda gente pena seu tanto.

Eu sigo como se diluído estivesse no meio

onde o manco flutua sem maior trauma.

Se não me entende não reclame,

soo contorno obscuro para ser evidente.

A minha alma nasceu em Minas,

sou barroco de nascença

e a quem demore na leitura derramo.

Eu desfiz meus altares e não rezo quando preciso,

não rezo quando preciso porque sempre necessito.

Escrevo para restituir às orações perdidas o lume,

e sinto minha mão ligada ao pulso refazer sentido.

Se minha queda lembra a sua não esqueça

já disseram que todos somos anjos caídos.

Não reze por mim, também não o farei por ti,

escolhas são responsabilidade de cada um.

Nunca esqueça, sempre deseje a felicidade alheia

como a quer quem a deseja

e não como julgas ser-lhe bem.

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Baltazar Gonçalves

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 23/03/2018
Código do texto: T6288684
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