O ano em que eu esqueci de mim/e outros contentos...

O ano em que eu esqueci de mim

Novo milênio

Ano 2000 de meu deus

Por uns meses, eu me pus a brincar como um deles

Depois de anos hibernando

dentro da minha introspecção

Eu esqueci de mim

Dei corda à minha vazão

Jorrou fora até que o medo voltou

E voltei,mas sabendo

que um dia eu me lembraria daqueles dias

Partida ou corrida

Viver é uma corrida contra a morte, o deboche do enorme

sobre o pequeno pote de esperanças,

Se encantando com o sereno

Se corre demais, não sabe que está partindo

Se sabe demais, pode antecipar o próprio destino

Diálogos com um mitólogo

Religar ao divino

Ou vestir fantasias??

Um desfile fúnebre

Ou um carnaval de alegorias??

Metáforas com cimento e tijolos,

Acredita em espíritos e múmias,

Demoniza o mais ateu,

O mitólogo não sabe que não sabe,

Que eu sei que ele não sabe,

E que tem medo de ter coragem, de aceitar,

Que o caminho da verdade é sem volta,

Que a última estrada é melancólica,

Olhando para um horizonte que não parece ter fim,

Vendo a si mesmo como um vertical minguante, cheio de sins,

e um único veneno de não,

Não quer dar o braço a torcer,

Quer a paz de ter algo à sua frente,

Um líder, um pai, um criador,

Quer ter algo que reduza a sua dor,

Que eu sei que ele sente,

Quer um muro de gente, que seja,

Quer dormir sabendo que faz sentido,

Quando não faz,

Quer continuar reduzido,

Não quer encarar as estrelas,

Não quer sair da armadura,

E entender que somos muito frágeis, indecentes,

Não quer aceitar que é imperfeito, enganado,

Quer continuar mais animal que humano,

Mais corpo que alma,

Tem medo do fogo,

E da escuridão dentro de si,

A sua religião,

Que eu chamo mitologia,

O acalma,

Mantém suas pequenas dimensões,

Fechado em seu mundo de certezas,

As dúvidas, distantes,

Deveria aceitar o vento constante,

Mas nasceu fardado,

Como um soldado,

Quando abriu os seus olhos,

Os fechou,

Estava escrito.