A corrida

O rio, cor de cobre, serpenteia

O verde decaído dos bambuzeiros.

Mendigos vivem em suas margens

E brotam dos esgotos que se acomodam nas várzeas.

Rio mineiro, pois são as montanhas que ele sangra,

Rasga-as, cosê-las; e elimina os dejetos dos mineiros.

Cidades soergueram-se a partir do seu sustento,

Homens escravizaram homens para pintar

Suas redondezas de um negro lisonjeiro.

Salvou Bandeirantes e também os matou,

Foi o recanto de filhos de caboclos e cafuzes,

Embalou o banho de inúmeras índias alenrcarzescas.

Meninos desfrutavam das suas águas barrentas:

Ótimas para as mães molharem os pés,

Ao perder-se na tarde, observando columins seminus

A brincarem nas águas.

Quando penso que tu se desviastes, surges,

Por baixo do asfalto, a exalar teu cheiro fétido.

Ele conduz, nunca é conduzido

É senhor, é Deus, é Estige, é o Lete,

Foi o céu de uns, de outros, o inferno.

Cachimbos de crack confundem-se com pequenos moluscos,

Nenhum o Rio distingue, apenas os arrasta,

E ao arrastar, ganha sua forma esquálida.

Perdido na urbe, quando mais corre mais a sente.

Os bambus, ressentidos e cabisbaixo, somente observam

Aquele que nunca se cansa de fugir:

Foge até ganhar a liberdade atlântica,

Foge com intuito de nunca mais voltar.

Mas como é triste a vida, que o condenou a sempre nascer.

Mataram outros que vivem por estas bandas.

Ele até procura por fim ao eterno movimento,

Quer tirar as botas velhas e balançar à rede com os pés para cima.

Não pode de maneira alguma deixar à vida,

Pois de sua vida dependem tantas outras,

Não pode ser responsável pelo assassínio dos seus;

No entanto, mal sabe que outros planejam lhe estreitar às margens.

Adeus garças, é o fim dos velhos pescadores,

Crianças não se despirão a sua margem,

Não olhará mais a calcinha das molecas

Sentadas maliciosamente nas ramas.

Agora, o lixo tóxico entope-lhe as veias e artérias;

O coração, pouco a pouco, perde a vontade de pulsar,

Corre, não para, será que encontrará saída?

Para onde ir? Correr para quê?

Os músculos começam a fraquejar,

A diástole e a sístole, como uma orquestra sem regente, descompassam-se,

Não exala nenhuma melodia mais,

O que lhe resta é ouvir o réquiem triste.

Escangalhou-se por confiar nos homens,

Calma, amigo, seu fim está próximo,

Pelo menos não sentirá dores,

Ao contrário, a causará em seus assassinos.