UMA QUESTÃO DE TEMPO (poesia em yin)
UMA QUESTÃO DE TEMPO (poesia em yin)
O corpo dá o sinal,
Edemas nas pernas,
É um desabrochar,
Um girassol de carne.
Gases explodem,
As secreções sobem
Queimação e azia,
Os ventos trazem dor lombar,
O sol muda tudo em mim.
O vestido não me serve
A sandália não entra,
Será que terei você?
Você faz parte de mim,
Passe mais um dia,
Se mexa e mexa comigo,
Se eu morrer, nasça,
Brilhe como a lua.
Nasça para o mundo,
Troque o seu endereço,
Mude de minha barriga
More em minha casa,
Você já mora em mim,
Desaloje de meu ser,
De minha carne,
Manteremos a alma,
O laço é infinito...
O muco escorre de mim,
Gelatina pegajosa,
Transparente,
Esbranquiçada,
Cor do pôr do sol.
Tudo é calmo,
Em breve te verei,
Vejo-o em meus sonhos.
Uma pontada corre,
O ventre parece rasgar,
O tempo diminui,
A pontada aumenta.
Trinta segundo eternos,
Outra rapidamente,
Marcar o tempo,
Cinco minutos de intervalo...
O tempo passa rápido,
Parece até um samba louco,
Samba enredo no carnaval,
Correr para o hospital,
Mesmo antes do sol.
Esqueço o meu nome,
Liquido corre pelas pernas,
Será que eu acabei me urinando?
Cadê a dor da ruptura da bolsa?
Amniótico que nome louco,
Mas qual é o meu nome?
Seja o jeito que for venha,
Rezo para Nossa Senhora,
Rezo para Nana Boroque,
Respiro e me arrependo,
Passou a pontada me perdoo.
O líquido é claro,
Graças a Deus e ao Salvador,
Não fez coco em mim,
Não se urinou nele mesmo,
É água, venha água!
Venha meu rebento,
Escorra pela água
A água corre na minha face,
Respiro.
Da água todos nós viemos
Jesus veio pela água,
Rompeu a mãe dele,
Sem episiotomia,
Sem anestésico local
Sem higiene nenhuma
Maria foi o dez por cento a viver
Jesus foi à minoria a viver,
Meu filho e Jesus vieram da água,
De um pequeno mar,
Mar interno de sons calmos
De calor e de amor,
Maria teria amado seu ventre?
Num período de estupros e violência,
Onde a lei judaica muda,
Onde os filhos da violência são filhos de Deus.
Respira e faz força!
A voz é de longe,
Estou só sem companheiro,
Sinto um sol a romper a madrugada
A rasgar o negro da noite
A espantar as estrelas,
A tocar a lua do sol
Hoje para mim o nascer do sol é violência.
Não sei se rio se choro
Cabeça,
Pescoço,
Ombros,
Tronco,
Pernas,
Pés,
Emoção,
Lágrima.
Lágrima com riso,
Com uma dor que acalma
Como espinha espremida
Multiplicado por mil.
A ilha se liga ao continente,
Ele não é, mas eu,
Agora eu apenas corro nele,
Um grito,
Ar!
Rompe o cordão,
Surge outro ser.
Paro para pensar,
Agradecimento ou choro,
Por que ser assim?
Agora de licença
Quero segurar meu filho,
Alimenta-lo,
Nina-lo
Filho sem ter pai,
Se fosse judeu na época de Jesus
Seria o filho do Pai,
Filho de Deus,
Mas hoje ele é meu filho
A dor ainda existe,
Parece que participei de uma maratona,
Agora esse alguém
Que surge de mim
É o alguém que vou amar.
Rompe o vínculo,
Assim começamos,
Ferramenta perfeita.
Nesse momento um calafrio,
A Dama de negro partiu,
Vejo o final da vida dele,
Vejo final de minha vida,
O fim será certeiro a todos,
Nome numa lapide fria.
André Zanarella 23-02-2018
Baseado no poema FERRAMENTA PERFEITA.